Tal como Judas beijou Cristo, traindo-o, também o Município de Braga beija os seus Munícipes, traindo-os quando lhes diz que está a apostar na Mobilidade Sustentável e está na Vanguarda da Mobilidade.

Corria o ano de 2019 quando implementaram uma “ideia”, hoje considerada absurda, à porta das escolas: Reservar alguns lugares para a tomada e largada de passageiros. Esta “ideia” já havia sido testada nos anos 80 e 90 noutras cidades, e rapidamente abandonada. O motivo é simples, é impossível a frente escolar ter capacidade para, num mesmo momento, ter 1 carro por aluno estacionado ou parado para o apanhar ou largar. Não há, simplesmente, espaço suficiente para isso.

As cidades europeias perceberam isso e começaram a retirar os carros das portas das escolas. Na Escócia e na Dinamarca não há qualquer circulação de carros até 400 metros da entrada da escola, apenas a pé, de bicicleta ou de transporte público. 

Na Suiça os diretores, coordenadores e professores definiram que a norma é que as crianças vão a pé ou de bicicleta para a escola. Se algum pai a for levar de carro deve justificar o motivo para o fazer. Qualquer carro parado na porta da escola é abordado pela polícia. 

Na França as frentes escolares têm vindo a receber obras, resultando em frentes livres de carros, para que as pessoas possam usufruir do espaço ou chegar até à frente da escola a pé, de bicicleta ou de transporte público. Só em Paris, no último ano, foram intervencionadas mais de 190 frentes escolares com o propósito de tirar dali os carros. 

Em Espanha temos os muito conhecidos superblocks em Barcelona ou a cidade para as crianças de Pontevedra, a par de outras cidades que libertaram as frentes escolares dos carros.

Mas em Braga julgam estar na “Vanguarda da Mobilidade” e implementaram o Kiss and Go na mesma, tendo ainda acrescentado algumas coisas que tornam a ideia ainda mais absurda: 

  • pintaram os lugares de azul – mesmo não havendo nada que regulamente isso.
  • colocaram uns postes com um sinal e muitos painéis adicionais – alguns até demais. 

Num desses painéis adicionais diz “tempo máximo 1 minuto”. Quem vai deixar as crianças numa pré-primária ou numa Escola Básica do Primeiro Ciclo nunca demora 1 minuto a tomar ou largar a criança. Só quem não tem filhos, ou nunca participou nas rotinas de entrada na escola pode achar que esse tempo seria suficiente.

A juntar a esta impossibilidade, que é óbvia, há o facto de os lugares raramente estarem livres. O que acontece é que as pessoas estacionam as viaturas naqueles lugares e… não são fiscalizados. Se o Kiss and Go já deixava muito a desejar, com os lugares ocupados com veículos estacionados, ainda mais deixa a desejar.

Há aqui uma contradição no que o Município diz querer implementar. A política do Município é ter mais pessoas a usar a bicicleta, a andar a pé e de transportes públicos, então não se coaduna com estar a promover a utilização do carro para levar crianças à escola. São políticas contrárias. A bota não bate com a perdigota.

O resultado é o que se vê nas frentes escolares: carros em cima dos passeios, nas passadeiras, em segunda e até terceira fila. Engarrafamentos intermináveis, frentes escolares completamente pejadas de carros, poluição em níveis inaceitáveis nas frentes escolares, ruído e insegurança. Insegurança para quem quer ir a pé ou de bicicleta. A juntar a isto, os autocarros presos no trânsito provocado por todos aqueles que teimam em ir de carro até à portinha da escola.

Com isto o Município não contribui para que as crianças e os jovens sejam autónomos e responsáveis nas deslocações casa-escola. O Município está a contribuir para criar “adultos totós”, como diz o Professor Carlos Neto. Teremos adultos que não conhecem a sua cidade se assim continuarmos. E, para além disso, está a prejudicar a saúde destas crianças em duas frentes:

  • Não dá a oportunidade às crianças destas começarem o dia a ativar o corpo numa deslocação a pé, de bicicleta ou de transporte público (que terá sempre uma parte a pé)
  • Enche as frentes escolares de poluição, não só de dióxido de carbono, mas de material particulado que as crianças inalam e ficam retidas nas narinas, nos pulmões ou chegam à corrente sanguínea (PM10, PM2.5 ou PM1). Resultado: doenças respiratórias crónicas, problemas pulmonares e cardiovasculares e, em alguns casos, situações mais graves.

Quando se convida as pessoas a levarem os filhos de carro, com Kiss and Go à porta, autocarros sem linhas dedicadas e insegurança nas ruas para quem vai a pé ou de bicicleta, não se está a promover a mobilidade sustentável.

Não basta tentar responsabilizar as pessoas por não optarem por modos de transporte mais sustentáveis. É preciso primeiro criar as condições para que essas opções possam ser tomadas.

O Kiss and Go é uma política de promoção da utilização do carro. É um flop quando se quer promover a Mobilidade Ativa e Coletiva. A mobilidade induz-se.