Braga gabava-se de ser a cidade Portuguesa com a maior zona com acesso limitado a carros. São 18 ruas e 6 praças que, há cerca de 30 anos, têm o acesso automóvel limitado, naquilo que se passou a chamar zona pedonal. Há cerca de 12 anos, aquando de Braga Capital Europeia da Juventude, mais algumas melhorias foram efetuadas em alguns passeios e algumas renovações na zona velha da cidade.
Hoje em dia as lojas mais prestigiadas e com rendas mais altas ficam exatamente onde há mais pessoas a andar a pé nas cidades, e isto não é diferente em Braga. Onde há pessoas a deslocar-se a pé, a economia fica a ganhar.
Em 30 anos não se conseguiu garantir a acessibilidade a pessoas com mobilidade condicionada em cadeiras de rodas no concelho, nem aos pais e mães que queiram circular com os seus filhos nos carrinhos de bebé. Na zona velha da cidade, onde está o centro histórico, continuamos a ter ruas inacessíveis, como é o caso da Rua de São Gonçalo, a Rua de São Domingos, a Rua do Burgo, a Rua de São Vicente, a Rua Cruz de Pedra, a Rua Visconde Pindela, a Rua de São Geraldo ou a Rua da Boavista, entre outras. Estas ruas, em plena cidade velha, não têm condições para quem se desloca a pé ou em cadeira de rodas. Em algumas destas ruas, as pessoas são obrigadas a deslocar-se a pé ou de cadeira de rodas pela faixa de rodagem. Em plena zona antiga de Braga!
Quem desce a Rua do Souto, em direção ao Arco da Porta Nova, na Rua Dom Diogo de Sousa, há uma passadeira com semáforos que cruza a Rua Dom Frei Caetano Brandão. Essa passadeira é inacessível a pessoas em cadeiras de rodas. As passadeiras em Braga continuam a não cumprir a norma de colocação de pisos podotáteis, sobretudo no que respeita à necessidade de contraste entre as cores dos pisos, que é necessária para dar resposta às pessoas de baixa visão. Não há o critério de sobrelevação das passadeiras, para garantir a continuidade do percurso pedonal, e levar o carro a subir ao nível dos peões, passando assim a mensagem de privilégio e prioridade do peão.
Se alargarmos o nosso perímetro de observação das condições para deslocações a pé ou de cadeira de rodas, para fora da zona antiga de Braga, encontramos ruas sem passeios ou com passeios exíguos, bem como as passagens aéreas que desde há 12 anos se diz que iam ser substituídas por passadeiras com semáforos. Até hoje, não há um plano, um prazo, uma meta, um cronograma, uma agenda para corrigir problemas e melhorar as condições para quem anda a pé ou de cadeira de rodas, ou para quem deseja andar a pé.
Desde há 30 anos a esta parte não houve mais nenhuma intervenção que levasse à criação de zonas com restrições ao trânsito automóvel nas ruas de Braga, como por exemplo faria sentido nas frentes escolares, bem como noutras artérias da zona antiga de Braga.
Há uns anos fizeram umas intervenções desgarradas e sem critério em sítios que primeiro chamaram zonas 30 e depois Áreas Mais. Aumentaram muito os passeios, não introduziram critérios nas passadeiras e na implementação dos passeios e não implementaram nenhuma política de estacionamento. A execução foi tão má e sem critério que hoje é preciso voltar a intervir nesses sítios.
A toda uma imensa lista de Ruas com dimensões reduzidas de passeios, com carros estacionados em cima dos passeios ou com mobiliário urbano que prejudica a circulação livre dos peões, o Município de Braga consegue ter abrigos de transportes públicos no meio dos passeios (como o que está junto ao Minho Center) e paragens completamente inacessíveis, com lugares de estacionamento marcados à frente da mesma.
Quando distribuímos o espaço público, planeando essa redistribuição com foco nas pessoas com mobilidade condicionada, privilegiando os modos ativos (andar a pé e de bicicleta), e privilegiando o transporte público, estamos a planear uma cidade para todos. Mas é preciso distribuir bem esse espaço, com critério, rigor, lógica e visão.
Existe um Estudo de Mobilidade e Gestão de Tráfego, que não está acessível no site do Município de Braga, que foi renomeado de PMUS – Plano de Mobilidade Urbana Sustentável de Braga, mas que não cumpre os pressupostos e critérios definidos pela União Europeia e também pelo IMT, do que deve ser um PMUS.
Esperava-se que hoje já existisse, em Braga, um Plano que garantisse a existência de critérios uniformes na implementação de medidas de promoção das deslocações a pé, de mobilidade condicionada e de bicicleta, com metas, objetivos, orçamento e ações, integrados num Plano Estratégico de Percursos Pedonais e Cicláveis que deveria ser um complemento ao PDM e poderia integrar um PMUS.
Nestes planos devem constar critérios que passarão a ser utilizados em todas as intervenções. Isto permite que sempre que haja uma intervenção não se tenha de pensar do zero onde fica ou que medidas têm de ter as caixas (de eletricidade, de gás, de telecomunicações), a tampa de saneamento, a caldeira da árvore, as escadas, a rampa, a sobrelevação da estrada para o passeio ser contínuo, o local onde são colocados os semáforos, as floreiras, as placas de sinalética ou de toponímia, os candeeiros de iluminação pública, os sinais de trânsito, as bocas de incêndio, …
Em suma, todo o mobiliário urbano e todas as soluções tipo, deviam já estar num plano para ser implementado em Braga, como em qualquer Município organizado. Dessa forma evitam-se intervenções sem critério, como a Rua Nova de Santa Cruz, as Áreas Mais ou a que pretendem fazer na Rua D. Pedro V. É nos detalhes que está o diabo!
Ao invés de se apostar em criar condições para os modos ativos e para o transporte público, a tática do PDM de Braga que entrará em discussão pública em Janeiro, passa por aumentar a capacidade de se usar o carro, prevendo a continuidade da trincheira na Avenida Padre Júlio Fragata, promovendo assim o uso do carro, e pressionando ainda mais as ruas e avenidas da cidade com carros. Vamos ter maiores congestionamentos, mais sinistralidade, mais poluição, menos qualidade de vida, menos saúde e uma perda de atratividade e de fixação de população na cidade e no concelho.
Sabendo que a condição necessária para a promoção da mobilidade a pé, de bicicleta e em transporte público é a infraestrutura, não se compreende este vazio de estratégia e de tática, nos mapas e documentos que estarão no próximo mês em discussão pública.
A mobilidade induz-se, mas com esta proposta de PDM apenas se induz mais o uso do carro.