Se levarmos uma criança a andar de bicicleta, andar de patins, andar de skate, jogar à bola, saltar na lama, brincar na areia, andar de baloiço, subir à árvore, dar cambalhotas, brincar com os amiguinhos, enfim, a brincar, dificilmente ela não ficará muito feliz. A grande pergunta acaba por ser sempre “onde vamos?”. Em Braga vamos ao já pequeno Complexo Desportivo da Rodovia, porque não há mais zonas verdes. Ou a um qualquer Parque Infantil que a Câmara não tenha desmantelado, porque não quis fazer a manutenção do mesmo. São muito poucos os sítios onde as crianças conseguem brincar no espaço público. Será que deviam existir mais sítios destes, isolados, como se ilhas se tratassem? Não deveríamos devolver o espaço público às crianças? 

Devíamos permitir que elas brinquem na rua, que se tornem ativas, que ganhem defesas, que convivam com os vizinhos, que façam amigos, que ganhem percepção do Mundo, dos perigos, dos riscos, que conheçam os seus próprios limites, que ganham autoconfiança e auto-estima, que se superem. Para isso o espaço público, melhor dizendo, o desenho do espaço público, é fundamental. Há dias ouvi o Prof. Doutor Carlos Neto a dizer que passeamos mais os cães do que brincamos com as crianças na rua. É triste, mas é verdade.

É verdade que há da parte de cada um de nós a responsabilidade de alterarmos isso. Mas o redesenho do espaço público, da cidade, levará a que essas alterações comportamentais aconteçam, e, por isso, há o dever de cuidado por parte dos Municípios em cuidar das pessoas. Há cidades onde os cidadãos têm sempre um espaço verde a menos de 300 metros, e outras em que é impossível transitar de carro nas ruas com entradas de escolas.

Uma das coisas que me iam dizendo era que eu ia andar de bicicleta até ser pai. Que depois de ser pai ia deixar de andar de bicicleta pelas responsabilidades que ia passar a ter. Tal não aconteceu. A Matilde ao longo da pré-primária foi 90% das vezes na minha bicicleta, 6% de autocarro, 3% a pé e 1% de carro. 

O dilema no meu pensamento era só um: “Quando ela quiser começar a ir em autonomia, como é que vai ser? A cidade não oferece condições para ela ir segura até à escola”. Esse dilema passou para a realidade há coisa de um mês. Durante 3 semanas quis ir na bicicleta dela, e na última semana quis ir de patins em linha. Como só tem 5 anos, ainda pode utilizar os passeios para se deslocar, mas a partir de 2027 deixará de o poder fazer (passa a ter mais de 10 anos). Portanto, a partir daí terá que utilizar a faixa de rodagem ou, caso exista, uma ciclovia.

O que a Câmara Municipal de Braga neste momento nos diz, com o desenho de cidade que mantém, é que as pessoas com 10 ou mais anos têm de utilizar a faixa de rodagem para se deslocar de casa para a escola. As crianças a pedalar têm velocidades muito baixas e têm um posicionamento baixo, com os carros a passar a 50 km/h ou mais por uma criança que nem a 10 km/h vá…

Nenhum Pai deixa uma criança ir em autonomia para a Escola nas condições que a Cidade atualmente oferece. Arrisco-me a dizer que nenhum Pai vai a acompanhar a criança ou adolescente a circularem ambos na faixa de rodagem em Braga, desde casa até à Escola. Isto porque para chegar à maior parte das escolas temos que usar parcial ou totalmente a Rodovia ou a Avenida 31 de Janeiro. Nem um adulto sozinho se sente seguro a pedalar na Rodovia. Por muita coragem que tenha e que até o faça, o sentimento é sempre de receio.

É por isso fundamental que a cidade redesenhe o seu espaço público para podermos ter crianças ativas, para que estas se possam divertir, para que se possam deslocar de forma segura para as escolas da nossa cidade. No final, teremos uma cidade mais eficiente, onde todos os modos de transporte podem ser utilizados, e onde a pessoa pode escolher como se vai deslocar, sem ver limitada a sua escolha por medo imposto por um único modo de transporte, como hoje temos.

Precisamos de uma infraestrutura que induza outras mobilidades. Precisamos criar condições para as pessoas passarem a usar e a procurar modos de transporte sustentáveis. Não basta dizer às pessoas “a culpa é vossa, não usam porque não querem”. Não, as pessoas não usam porque têm medo das Ruas e Avenidas que a cidade tem neste momento. É preciso criar um ambiente que atraia as pessoas.

A mobilidade induz-se.