Era Maio de 2018 e saíam as notícias de que a AGERE estava a lançar um sistema de contentores único e inovador em Portugal! Finalmente deixávamos de ter que colocar o saquinho na porta e só depois das 20h, se fosse antes podíamos ser multados! Foram anunciados 4.400 contentores, sendo que alguns estavam enterrados, outros à superfície, mas certo é que toda a população passaria a ter contentor a 100 metros da sua porta. Era essa a promessa. 

E se este fosse um texto sobre Asterix e Obelix, podíamos continuar assim “Toda? Não! Um bairro povoado por irredutíveis bracarenses mantém, agora e sempre, os saquinhos do lixo no chão!”. Bem no coração de Santa Tecla, na freguesia de São Victor, a AGERE decidiu que aquelas pessoas não têm direito a contentores. E não é por ser um Bairro Social, porque nas Enguardas, por exemplo, há contentores de lixo. Em Santa Tecla, os sacos de lixo continuam no chão. Rasgam-se os sacos e espalha-se o lixo, enfim. Em pleno coração da cidade, temos um sítio sem contentores há 5 anos. Esperemos que depois das obras que ali decorrem, passemos a ter contentores.

Os contentores “inovadores” também não foram para toda a gente. Nalguns sítios eles foram enterrados, sem se perceber bem o critério utilizado, mas a densidade populacional não foi o critério. Isto porque, por exemplo, na zona do Braga Parque, a zona com maior densidade populacional, ou seja, onde mora mais gente por metro quadrado, não há um único contentor enterrado. Noutros foram aqueles cinzentos grandes, pousados na via pública. E o resto foram…contentores de rodinhas. Muitos deles colocados no meio da estrada, sem respeitar qualquer regra de ocupação do espaço público. E assim continuam!

Melhor que os sacos no chão é de certeza. Agora ser “inovador” é outra coisa. Um conceito inovador é um conceito que acrescenta uma novidade, aporta valor, melhora o sistema, coloca uma nova camada de conhecimento ao que já existe. Foi uma novidade para Braga deixar de ter sacos no chão à porta de casa, mas não foi para Portugal, muito menos para a Europa. E, no que concerne à fatura a pagar todos os meses, então não trouxe inovação nenhuma.

Vejamos, a AGERE e a BRAVAL promovem a reciclagem. Pelo menos tentam incentivar através de textos e da infraestrutura existente. No entanto, a própria APA – Agência Portuguesa de Ambiente, diz que sem mecanismos de “pay as you throw” (pague à medida que for reciclando/deitando o lixo), isso não é suficiente.

E porquê que não é suficiente? Uma família que efetue a separação do lixo, que faça compostagem, e praticamente não faça lixo VS. uma família que não faça qualquer separação, acabam por pagar os resíduos em função da água consumida. Vamos assumir que as duas consomem a mesma água. O valor da água pode até ser um dos mais baratos do país, mas no final o Bracarense vai pagar uma fatura elevada, porque a AGERE decidiu que o consumidor paga toda a TGR – Taxa de Gestão de Resíduos, em função da água que consome. Ou seja, quer separemos, quer não separemos, pagamos o mesmo. E quando se mexe no bolso do cidadão, lá se vai a consciência ambiental.

Então, como podia o sistema ser verdadeiramente inovador? Se eu, enquanto cidadão, tivesse um cartão que utilizasse sempre que fosse depositar o lixo e nesse cartão ficassem registados os kg de lixo que eu depositasse. Aí sim, estaríamos perante um sistema inovador, justo e que convidava as pessoas a reciclar. Para além disso, o caixote só abriria mediante a apresentação de um cartão/telemóvel com uma app/introdução de um código e associaria o lixo àquela pessoa. Evitava que se depositasse tudo e mais alguma coisa dentro dos caixotes, como hoje em dia acontece.

Estaríamos perante uma maior complexidade do sistema? Claro que sim, implicava que os caixotes pensassem no lixo que lá está dentro. É absurdo? Não. Tanto que já existem em várias cidades no Mundo e é recomendado – até em Portugal – que se implementem sistemas deste tipo.

Há outra possibilidade, que é manter tudo como está em termos de lixo orgânico e implementar um sistema de recompensa na reciclagem. Como quando íamos ao extinto Feira Nova levar as garrafas e recebíamos um recibo com um valor para descontar a seguir. Também podíamos depositar a reciclagem e, de alguma forma, ficar registada a quantidade do que reciclamos, passando isso a ser deduzido na fatura da AGERE, por exemplo.

A gestão dos resíduos urbanos, bem como da localização e tipologia dos caixotes do lixo, são uma opção política. Mas é uma responsabilidade da cidade, que diz querer ser sustentável, promover efetivamente o aumento da reciclagem e desincentivar que se deite tudo ao lixo comum. E isso só se consegue fazendo com que quem deite tudo ao lixo pague mais do que quem recicle. Neste momento, a fatura (total) da AGERE é das mais elevadas do país, porque trata da mesma maneira um Bracarense que recicle e um que não recicle. 

Está na altura de se efetuar o cálculo do valor pago pelos resíduos efetivamente produzidos. Enquanto se falar muito de sustentabilidade, mas não se fizer nada para a atingir, estaremos apenas a assistir a greenwashing e a enganar as pessoas. Estamos todos um bocadinho fartos disso.